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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Cientistas querem instituir fronteiras planetárias


Eles propõem um conjunto de limites seguros para os impactos humanos sobre a Terra
por David Biello
Nasa
Buraco de ozônio (roxo) sobre a Antártida pode ser visto como uma medida do impacto da humanidade sobre a Terra
A extensão do impacto da humanidade sobre o planeta se torna cada vez mais aparente. Eliminamos espécies a uma taxa equivalente à maior das grandes extinções de todas as eras geológicas e contribuímos para uma rápida acidificação dos oceanos, para a diminuição das calotas de gelo e até mesmo para o desaparecimento de deltas de rios. Agora, um grupo internacional de 29 cientistas toma uma atitude inédita ao estabelecer alguns limites ambientais concretos para o planeta.

Johan Rockström, da Universidade de Estocolmo, e colegas propuseram versão online em 23 de setembro na Nature, (SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL integra o grupo editorial Nature), nove “fronteiras planetárias”. Essas fronteiras, relacionadas com a mudança climática, acidificação dos oceanos, poluição química e outros assuntos, destinam-se a estabelecer limiares ou limites seguros para os sistemas naturais com relação ao impacto humano, embora alguns números ainda não tenham sido determinados exatamente.

Alcançamos um estágio planetário de sustentabilidade onde estamos mexendo com processos interdependentes do Sistema Terra em escala global”, observa Rockström. “Quais os processos do Sistema Terra que determinam a capacidade do planeta permanecer estável?”

A pesquisa considera a época do holoceno como estado estável desejável – os 10 mil anos desde a última era do gelo durante os quais a civilização humana floresceu – e tenta identificar as principais variáveis que poderiam levar os ciclos planetários para além do limiar de segurança. Portanto, a principal variável para a mudança climática, por exemplo, seria a concentração de dióxido de carbono atmosférico, bem como o consequente aumento na quantidade de calor aprisionado. O CO2 atmosférico alcançou atualmente 387 partes por milhão (ppm), bem acima das 280 ppm da era pré-industrial. O limiar de segurança identificado pelos cientistas, incluindo o climatologista da Nasa James Hansen, é de 350 ppm, ou um aumento de aquecimento total de 1 watt por m2 (o aquecimento atual é de cerca de 1,5 watts por m2).

Começamos por quantificar, muito aproximadamente, onde acreditamos que esses limiares devam se localizar. Todos têm grandes margens de erro”, observa o ecologista Jonathan Foley, diretor do Instituto do Meio Ambiente da University of Minnesota, e um dos autores. “Não sabemos exatamente quantas partes por milhão seriam necessárias para deter a mudança climática, mas acreditamos que vá começar a acontecer ao redor de 350 ppm”.

A humanidade já passou dos limites de segurança em mais duas das nove fronteiras de segurança – perda de biodiversidade e disponibilidade de nitrogênio (graças aos modernos fertilizantes). Infelizmente, muitos dos processos se afetam mutuamente. “A transgressão de um limiar torna os outros mais vulneráveis”, acrescenta. A perda de biodiversidade, por exemplo, “é acelerada em um planeta excessivamente quente”.

Diversos cientistas elogiam o esforço, mas criticam o valor correto dos limiares estabelecidos. William Schlesinger, biogeoquímico do Instituto Cary de Estudos de Ecossistemas, argumenta que os limites para a adubação fosfatada não são muito rígidos e podem permitir que “uma prejudicial degradação lenta e difusa continue quase que indefinidamente”. Permitir que o uso da água potável, em grande parte para a agricultura, aumente dos atuais 2.600 para 4.000 km3 no futuro, possibilitará mais degradação em locais de desastres ambientais como no esgotado Mar de Aral, na Ásia. Isso também afetaria sete grandes rios, incluindo o Colorado, nos Estados Unidos, que não alcançam mais o mar, observa David Molden, vice-diretor geral de pesquisa do Instituto Internacional de Gestão Hídrica, no Sri Lanka. (Um quilômetro cúbico de água equivale a 999 trilhões de litros).

Mesmo o limite de 350 ppm para o dióxido de carbono é “questionável”, afirma o físico Myles Allen, do Grupo de Dinâmica do Clima da University of Oxford. Ele acredita que faz mais sentido se preocupar em manter as emissões cumulativas abaixo de um trilhão de toneladas métricas, embora isso signifique que a humanidade já utilizou mais da metade do total permitido de emissões.

Apesar dos impactos no planeta, as condições da humanidade nunca foram tão boases em termos de prosperidade material. A questão é: como continuar a melhorar a condição humana? “como podemos sustentar um mundo que abrigará 9 bilhões de pessoas sem destruir o planeta, questiona Foley Saber, ao menos um pouco, onde se encontram as zonas de perigo é um primeiro passo muito importante”, considera ele.

Ainda existe esperança. A humanidade já ultrapassou um desses limiares antes ao diminuir os níveis de ozônio na estratosfera com emissões de substâncias que o destroem (o “buraco de ozônio”). Fomos capazes de retroceder graças à cooperação internacional e ao protocolo de Montreal, de 1989. “Conseguimos nos afastar da fronteira do ozônio e sérios esforços estão sendo realizados em âmbito regional para proteger a biodiversidade, reduzir a poluição agrícola, a utilização de inseticidas, a demanda de água e diminuir a conversão de terras”, destaca a cientista ambiental Diana Liverman, da University of Arizona, um dos autores dos novos limiares. “Isso dá alguma esperança de que conseguiremos gerenciar nosso impacto planetário se tivermos determinação para isso.”

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